Esse artigo é fruto de um estudo feito para a edição do dicionário jurídico e previdenciário e por isso mesmo é bem introdutório.
Espero que aproveitem.
Primeiramente,
quanto a um instituo tão complexo e extenso, o melhor a se dizer, de início, é
que não se trata da perda do direito de ação, nem do direito propriamente dito,
mas sim da perda da pretensão deduzida em juízo, da irrealizabilidade da
pretensão já deduzida.
Dizer
que seria perda do direito de ação, seria o mesmo que ignorar que o processo
tenha tido um trâmite, ainda que sumário, e uma sentença, e todo o movimento
que envolve essas circunstâncias.
O
direito de ação foi exercido, e em épocas mais remotas sequer se discutia a
aplicabilidade do instituto de ofício, pois somente o interessado poderia
arguir tal prejudicial, contudo, com a alteração do Código do Processo Civil,
em seu artigo 219, § 5º, hoje há quem sustente a aplicação de ofício no
processo do trabalho. Em um ou outro caso, processo haverá, direito de ação terá
sido exercido, já que se trata de um direito abstrato.
Perda do
próprio direito muito menos, pois em verdade a prescrição atinge como dito, a
realização processual da pretensão, mantendo intacto o direito em si. Tanto é
assim que a parte a quem aproveita a prescrição pode renunciar a tal instituto,
pagando a dívida a seu credor, sem que isso importe no direito de reaver o que
pagou, numa espécie de repetição do indevido, pois devido é, já que o direito
não se perde, mas sim a pretensão processual.
É assim
que dizer que a prescrição atinge a pretensão é a melhor e mais correta forma
de identificar o instituto.
A
prescrição conta com tantos anos que talvez nem se tenha uma notícia exata da
sua primeira existência ou aplicação. As razões de sua criação remontam a
motivos de ordem social, como uma forma de pacificação das relações, não
permitindo que alguém se torne eternamente devedor de outrem e ao mesmo tempo
exigindo do credor uma atitude minimamente coerente quanto ao tempo de
movimento de processo. O Professor Homero Batista Mateus da Silva explica de
forma magistral tal instituto, em seu livro que é resultado de sua tese de
mestrado intitulado de Estudo Critico da Prescrição Trabalhista, pela editora
Ltr.
A nossa
legislação trata da prescrição em diversas vertentes, mas as que nos interessam
diretamente são: a Consolidação das Leis do Trabalho, a Constituição Federal e
o Código Civil Brasileiro.
Só uma
nótula antes de iniciarmos o estudo legal da prescrição é o fato de que a
prescrição só atinge as pretensões de cunho condenatório, não atingido as
pretensões declaratórias ou constitutivas, como se verá a seguir.
A Consolidação
das Leis do Trabalho em seu artigo 11 previa somente a prescrição de 2 anos,
sem diferenciar os períodos de contrato ou pós contratuais, mas dizia que era
somente para os direitos previstos na própria Consolidação. Justifica-se tal
previsão, pois em verdade não havia uma imaginação de um universo além da
própria consolidação, como celeiro de direitos trabalhistas. Lembremos que a
consolidação a qual nos referimos data de 1943.
Mudanças
vieram, mas primeiro vejamos a previsão constitucional.
Em se
tratando de previsão pela Constituição Federal devemos lembrar que essa data de
05 de outubro de 1988, ou seja, quase meio século após a CLT.
O artigo
7º, XXIX da Constituição Federal prevê que as pretensões na seara trabalhista
prescrevem em cinco anos, a contar da propositura da demanda, desde que
respeitado o limite de dois anos para início da demanda após a cessação do
contrato de trabalho.
Aqui
houve uma bipartição do prazo de contagem da prescrição, o que era uma
novidade, até mesmo para os civilistas, acostumados com prazos diferenciados de
prescrição, mas não com dupla contagem numa mesma relação.
A
diferença de contagem se justifica pela existência de um elemento no direito do
trabalho que é uma dos pilares justificadores de sua autonomia em relação ao
direito que lhe deu origem, o obrigacional civil, que é a subordinação
jurídica.
Enquanto
sujeito a subordinação jurídica, imposta pelo poder do empregador, o prazo é de
cinco anos, mais tempo para propor a ação, portanto. Após restar amenizada a
referida subordinação, com a extinção do vínculo – isso mesmo, amenizada, pois
em verdade o empregado nunca está completamente excluído da possibilidade de
voltar a ser subordinado por seu empregador – o prazo reduz para dois anos,
mais curto, portanto.
Contudo,
é preciso organizar esse raciocínio, a partir da ideia de que se computam os
dois para a mesma relação jurídica.
Assim,
pode o interessado propor ação durante a existência de vínculo de emprego,
situação em que sequer houve disparo do início do biênio prescricional, pois a
existência do contrato é fato impeditivo de fluência de prescrição bienal, ou
total como alguns preferem. Nesse caso só se computa os cinco anos, assim, da
propositura da demanda retroage no tempo cinco anos, e as parcelas vencidas
nesse interim são realizáveis, ou seja, exigíveis, as que contarem com mais de
cinco anos, estão alcançadas pela prescrição, ou seja, pela irrealizabilidade
da pretensão. Isso tudo para se falar em parcelas de forma genérica, lembrando
que o FGTS tem regra própria, descrita na Lei 8.036/1990 e das férias, por
exemplo, tem contagem própria, artigo 149 da Consolidação das Leis do Trabalho.
Contudo,
se a demanda é proposta após a extinção do vínculo, surge um primeiro elemento
a ser preenchido, o biênio, ou seja, o interessado precisa propor a demanda
antes da fluência dos dois anos, como requisito essencial de contagem de
quinquênio. Se a demanda for proposta pelo interessado antes da fluência
integral do prazo de dois anos, ou seja, do biênio prescricional, passa-se a
contar a retroação do quinquênio, também da data da propositura da demanda. Se
acaso desrespeitado o biênio, toda a pretensão resta prejudicada, pois se
tornou irrealizável.
Com
referida mudança, a Consolidação das Leis do Trabalho precisou se adequar a
previsão da lei maior e houve uma alteração dada pela Lei 9.658/1998, onde a
redação do artigo 11 passou a contar com bipartição de prazos, tal qual a
Constituição.
Vale
lembrar que a norma constitucional também estendeu a aplicação da prescrição ao
rurícola, como se lê do “caput” e do próprio inciso XXIX, ambos do artigo 7º.
Além da bipartição de prazo, a referida lei
que alterou a CLT também previu a imprescritibilidade dos pleitos de anotação
de carteira de trabalho e previdência social para fins previdenciários. Aqui
resta clara a aplicação do que acima foi dito, quanto a não aplicação da
prescrição para declarar e constituir direitos, como é o caso do vínculo de
emprego, declarado em juízo e anotado em carteira.
Além disso,
a Consolidação das Leis do Trabalho tem outra previsão especifica, quanto a não
fluência da prescrição para o menor trabalhador. Trata-se da regra insculpida
no artigo 441 da Consolidação das Leis do Trabalho.
A regra
não leva em conta a capacidade civil descrita no artigo 3º do Código Civil
Brasileiro, quanto à idade do absolutamente incapaz, de 16 anos, mas sim a
ideia de menor em geral, por isso, se aplica até os 18 anos, e, embora haja
teses em contrário, aquela parece ser a mais razoável.
Ao mesmo
tempo exige que esse menor seja trabalhador, não qualquer menor, como o
herdeiro, por exemplo. Aqui também há discussão quanto à emancipação para o
menor acima dos 16 anos com renda própria advinda de relação de emprego, como
descrito no artigo 5º, V do Código Civil Brasileiro, mas que a maioria da
doutrina entende não aplicável, de forma pronta e acabada, ao menor em geral,
trabalhador a partir dos 16 anos, mantendo a regra da não fluência da
prescrição descrita no artigo 441 da Consolidação das Leis do Trabalho.
Após
esse breve tratamento específico da prescrição, pela lei diretamente ligada às
relações de emprego, temos de fazer uma análise, ainda que breve, quanto as
regras descritas no Código Civil, não em relação ao prazo propriamente dito,
pois esse somente excepcionalmente terá aplicação nas relações de emprego, mas
sim da operacionalização da prescrição.
Primeiramente
temos que a prescrição se conta em data idêntica a de inicio de sua contagem,
ou seja, os prazos em anos se contam da mesma data em que começara, assim, por
exemplo, se a extinção se deu em 05 de fevereiro de 2010, o fim da contagem do
biênio prescricional será em 05 de fevereiro de 2012.
Os
artigos 197 a 199 do Código Civil Brasileiro tratam das causas que impedem ou
suspendem a fluência da prescrição. Nessas condições ou a prescrição sequer
inicia sua contagem ou para-se a contagem e volta e onde parou.
Como
exemplo no direito do trabalho já citamos a regra descrita na própria Constituição
Federal, qual seja, a existência de vínculo é causa impeditiva de fluência de
biênio prescricional, como descrito no artigo 199, I do diploma civil. Aqui o
prazo prescricional sequer começa a fluir.
Quanto à
suspensão do prazo podemos citar a disposição do artigo 625-G da Consolidação
das Leis do Trabalho, quando houver submissão do litigio às comissões de conciliação
prévia, em que os prazos prescricionais se suspendem por dez dias, pela
combinação com o artigo 625-F do mesmo diploma. Aqui o prazo prescricional
inicia a contagem, para em razão da causa suspensiva, se mantem incontável
enquanto perdurar a causa suspensiva e volta a fluir a partir do fim da causa
suspensiva, somente pelo restava do prazo.
Ainda há
causas que interrompem a prescrição, como descritas nos artigos 202 a 204. Como
exemplo, podemos citar a propositura de demanda dentro do biênio prescricional,
em que a prescrição se interrompe, mas por uma única vez. Assim, proposta a
ação e extinta essa sem resolução de mérito, teremos a aplicação da interrupção
da prescrição pela primeira demanda proposta. Podemos aplicar, com adaptações,
a regra descrita no artigo 202, I do diploma civil, que prevê expressamente a
possibilidade de interrupção pelo despacho citatório do juiz, como não há esse
despacho na Justiça do Trabalho, podemos considerar da propositura da demanda,
uma vez que a citação é ato ordinário da secretaria da Vara.
Uma vez
interrompido o prazo e cessada a causa interruptiva, o prazo volta a fluir, mas
agora integralmente, ou seja, pelo exemplo acima, haverá mais dois anos para a
propositura da demanda a contar da extinção prematura do primeiro processo,
respeitado os pedidos descritos na primeira demanda.
Duas
outras regras de operacionalização de prescrição são muito importantes, as
descritas nos artigos 200 e 201 do Código Civil Brasileiro.
A regra
do artigo 200 se refere à possibilidade de haver processo criminal que impacte
na discussão do processo do trabalho, ocasião em que a prescrição desse último
não flui, enquanto perdurar o processo criminal. Exemplo pode ser dado na justa
causa que discute ato de improbidade, onde a culpa descrita no processo
criminal de forma definitiva, deve ser transportada para o processo do trabalho,
ressalvada a hipótese de não definição da culpa.
A regra
do artigo 201 diz respeito à possibilidade de uma obrigação ser indivisível e
aplicável a duas pessoas indistintamente, na ocasião em que uma delas se
beneficia da suspensão da prescrição. Nesse caso uma das pessoas se aproveita
da suspensão da prescrição da outra. Exemplo, trabalhador falecido que deixa
esposa e filho, este absolutamente incapaz. A regra do artigo 198, I aplicável ao
menor, se estende a esposa, pela obrigação indivisível transmitida pela morte
do trabalhador, quanto às verbas trabalhistas.
Muitas
regras e posições jurisprudenciais cercam a prescrição, um cem número de
discussões e decisões já foram levadas a cabo pelos órgãos judiciais, pelos
doutrinadores e estudiosos do direito, por isso, o manancial de circunstâncias
que cercam esse tema é infindável, exigindo do leitor que se aprofunde com
muita presteza nesse instituto, que a par das dificuldades é absolutamente
apaixonante.
» Referências normativas:
CLT,
arts. 11, I e II e parágrafo único, 149, 625-F, 625-G e 441; CPC, art. 219, §
5º; CC arts. 3º, 5º, 197 a 204; CF, art. 7º, “caput” e inciso XXIX; Lei
8036/1990.
» Referências normativas:
Silva,
Homero Batista Mateus da, Estudo Critico da Prescrição Trabalhista, editora
LTr, julho de 2004.
» N. do
Org. Veja também: pretensão; aplicação da prescrição; suspensão
da prescrição; interrupção da prescrição.
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