terça-feira, 21 de junho de 2011

Capacidade postulatória e o TST

Por Mauricio Pereira Simões*

A capacidade postulatória como um dos pressupostos de desenvolvimento válido do processo tem tratamento diferenciado nos processos trabalhistas, em relação aos processo comuns.
Enquanto o Código de Processo Civil trabalha com a ideia de capacidade postulatória do advogado, como regra, a Consolidação das Leis do Trabalho entende que as próprias partes têm capacidade postulatória plena. Trata-se da análise dos artigos 36 do processo comum e do artigo 791 do processo especial.
Que não se engane o leitor, pois no processo civil também é possível que a própria parte esteja investida de capacidade postulatória, nas hipóteses de ausência de advogado na comarca, quando os que houverem não se dispuserem a patrocinar a demanda, foraem impedidos ou quando a parte é advogado legalmente habilitado. Da mesma forma, no processo do trabalho a pesença do advogado não só é possível, como desejada. Assim, as regras são inversas, sem exclusão, contudo, das premisas inversas.
Muitos embates jurídicos já foram travados para a mudança desse cenário no processo do trabalho, a começar pela promulgação da Constituição Federal de 1988, que em seu artigo 133 prevê a indispensabilidade do advogado na administração da Justiça.
Em seguida, em 1994, a Lei 8906, conhecida como estatuto da advocacia, em seu artigo 1º, inciso I previa a atividade privativa da advocia para a postulação em juízo.
Em nenhuma dessas oportunidades, no entanto, foi possível vilsumbrar a superação da disposição trabalhsita especial.
Com isso, o que se vê, até hoje, é a ampla aceitação da capacidade postularória plena para as partes dentro das lides submetidas a apreciação da Justiça do Trabalho.
Com o advento da Emenda Constituiconal 45 de 2004, a qual trouxe uma singular modificação das competências da Justiça do Trabalho, passou-se a conviver com a competência em razão da matéria e não mais em razão das pessoas. Muitas matérias passaram a fazer parte da competência desta Especializada Justiça, mesmo não se tratando de relação de emprego em sentido estrito.
Foi nesse momento histórico da Justiça do Trabalho que o Tribunal Superior do Trabalho começou a implementar medidas de revisão de adequação de alguns pressupostos, tanto de formação, quanto de desenvolvimento válido dos processos, em especial a capacidade postulatória.
A Instrução Normativa 27 de 2005, logo em seu artigo 1º determina a observância dos procedimentos descritos em leis especiais, quando houver essa previsão expressa, como no caso de mandado de segurança, ação cautelar, ação rescisória, "habeas data", dentre outras descritas no artigo em comento. O que há de comum em todas essas ações? elas estão previstas em leis próprias, com regramentos processuais próprios. Nessas ocasiões será possível que a própria parte venha a juízo, em capacidade postulatória plena, sem advogado? A resposta, como quase sempre no direito, é depende.
Se a lei que institui a medida própria o permitir, sim, se a lei fizer a previsão inversa, a resposta é não. Vejamos dois exemplos claros e antagônicos.
"Habeas Corpus", precisa de advogado para impetrá-lo? Ação rescisória, precisa de advogado para a propositura?
A resposta para a primeira indagação é negativa, qualquer um pode, individual e diretamente, impetrar "habeas corpus", e diferente não seria na Justiça do Trabalho. Já quanto a ação rescisória, por estar prevista no corpo do Código de Processo Civil, e tendo este regra clara quanto a capacidade postularória do advogado, artigo 36, como visto, resta claro que a resposta é positiva, somente por meio de um advogado se maneja a medida.
Assim, essa instrução foi pioneira no reconhecimento da partição da capacidade postularória, e com ela dos honorários de sucumbência, a teor do artigo 5º da mesma IN.
A par de tudo isso, que já norteia o leitor acerca do entendimento do C. TST acerca do assunto, temos de conviver, hoje, com a editada Sumula 425, do mesmo tribunal.
A súmula em questão tem a seguinte redação:

"425. Jus Postulandi na Justiça do Trabalho. Alcance. (Res. 165/2010 - DeJT 30/04/2010)
O jus postulandi das partes, estabelecido no art. 791 da CLT, limita-se às Varas do Trabalho e aos Tribunais Regionais do Trabalho, não alcançando a ação rescisória, a ação cautelar, o mandado de segurança e os recursos de competência do Tribunal Superior do Trabalho."

A pergunta que não quer calar a essa altura é: qual a extensão dessa súmula?
Ao nos depararmos com uma nova súmula ou orientação jurisprudencial é sempre saudável e recomendável que as pessoas tenham a curiosidade de pesquisar os precendetes da jurisprudência, ou seja, ler os acórdãos que deram origem a formação da uniformização pelo órgão de sobreposição da Justiça do Trabalho.
Pois bem, ao ler os precedentes da súmula referida - o que está disponível no próprio site do C. TST - percebemos que os assuntos que deram origem a essa súmula estão todos eles, sem exceção, ligados a demandas de competência originária de tribunais, TRT´s ou TST, como ação rescisória, ação cautelar, madando de segurança, todos com origem em Tribunais, nenhum deles iniciado em varas do trabalho.
É curioso notar que essas medidas, desde a ediçao da IN 27/2005 já tinham esse regramento estabelecido pelo TST. Lembremos do comentado artigo 1º da referida instrução, que prevê a aplicação dos ritos descritos no processo especial trabalhista, salvo quando houver previsão de procedimento próprio nas ações especiais.
Com isso, eu lhes pergunto: A previsão da súmula 425 à luz de seus precedentes traz alguma novidade em relação ao artigo 1º da IN 27/2005? A resposta é não.
Assim, poderíamos incialmente inferir que o C. TST pretendeu somente restringir o "jus postulandi" - como é conhecida a capacidade postulatória das partes na CLT - para essas ações que têm procedimentos previstos em leis próprias e as quais não capacitam as partes, mas sim os advogados para a postulação em juízo.
Tudo estaria na mais perfeita ordem lógica e legal. A CLT prevê que a capacidade descrita no artigo 791 é para iniciar e seguir os processos até o final, que para o bom entendedor sempre restou claro, o TST, até pelo fato de que o STF não compõe, de forma exclusiva, a organização da Justiça do Trabalho, mas sim o Poder Judiciário como um todo.
A partir desse racíocínio seria clara a limitação do "jus postulandi" somente naquelas ações, que se diga, não estando descritas na CLT, nunca estiveram submetidas ao artigo 791 e não teriam razão para estarem agora. Perfeito, sendo relação de emprego, com processo iniciado à luz da CLT nas varas, o "jus postulandi" estaria liberado em todas as instâncias, inclusive o TST, certo? mais ou menos.
Numa rápida leitura no Regimento Interno do TST, percebemos lá pela casa dos artigos 164 e 171, no Título II do Livro II, como se formam súmulas e orientações jurisprudenciais. Há a necessidade de um certo número de acórdãos de turmas ou de seções, unânimes ou por maioria, para que se  possibilite a uniformização.
Contudo, novamente, a pergunta que não que calar é: os acórdãos referidos, para darem ensejo a uniformização de assunto, vinculam o TST no momento de formar a editar uma súmula ou uma orientação jurisprudencial? a resposta é não, o precedente não é inexorável.
Assim, colaciono agora os acórdãos descritos no site do TST como precedentes da súmula 425, para que todos possam analisar, quais foram os processos que deram origem a súmula:

"EAIRR e RR 8558100-81.2003.5.02.0900 Red. Min. João Oreste Dalazen
DEJT 01.04.2011 - Decisão por maioria [Consulta_documento].
. ROAG 98900-98.2008.5.15.0000 Min. José Simpliciano Fontes de F. Fernandes
DJ 13.03.2009 Decisão unânime [Consulta_documento].
. ROAG 114400-77.2007.5.03.0000 Min. Ives Gandra da Silva Martins Filho
DJ 12.12.2008 Decisão unânime [Consulta_documento].
. AR 1853596-77.2007.5.00.0000 Min. Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira DJ 05.12.2008 Decisão unânime [Consulta_documento].
. RXOFMS 8196400-90.2003.5.16.0900 Min. José Simpliciano Fontes de F. Fernandes
DJ 01.08.2003 Decisão unânime [Consulta_documento].
. ROAR 295979-22.1996.5.08.5555 Min. João Oreste Dalazen.
DJ 14.05.1999 Decisão unânime"

Perceberam? o primeiro racíocinio era coerente com os precedentes, ou seja, limitação do artigo 791 somente para ações típicas de outros ordenamentos. Contudo, como já dito, não há essa vinculação.
O TST pode chamar o assunto para ser uniformizado, a partir de determinado número de julgados, de determinadas turmas ou seções, por maioria ou unânimes, mas na hora de editar a súmula ou orientação jurisprudencial pode dar a extensão que pretender para o instituto.
Resumindo: ao perceber a discussão sobre qualquer matéria de direito, traz o instituto, depois de certos precedentes para ser uniformizado, mas não nos limites das decisões emanadas nos precedentes, mas sim nos limites em que entender cabível para o assunto.
Foi assim que a súmula 425, na sua última parte levou em conta os precedentes, a IN 27/2005 e descreveu, num rol exemplificativo, quais processos típicos de outro ordenamento não comportariam o "jus postulandi".
E, na primeira parte, limitou o "jus postulandi" também para as demanadas individuais baseadas na CLT, ao dizer:

 "O jus postulandi das partes, estabelecido no art. 791 da CLT, limita-se às Varas do Trabalho e aos Tribunais Regionais do Trabalho".

Ou seja, ninguém, em nenhum processo, poderá acessar o TST, em quaisquer de suas competências - originária, recursal ou uniformizadora, sem a presença de um advogado.
Muitas coisas decorrerão dessa disposição, como honorários de sucumbência, juízo de admissibilidade, a discussão sobre ser ou não um novo pressuposto, se os honorários decorrerão da simples interposição ou somente do julgamento, se conviveremos com um sistema híbrido de capacidade postulatória e de honorários de sucumbência, dentre diversos outros assuntos, que serão a seu devido tempo debatidos nesse espaço.
Por enquanto, a missão era debater a nova súmula, já não tão nova, e sua real extensão.
Espero que o leitor compreenda os desígnios da discussão e aproveite da melhor forma para no seu cotidiano aplicar as lições trazidas nesse singelo ensaio, seja para fins de concurso, seja para fins de atuação profissional. 
As premissas estão postas e a discussão é sempre saudável, aguardemos.
Forte abraço do autor, Mauricio.
Referências bibliográficas:
Simões, Mauricio Pereira - Direito Processual do Trabalho para concurso de Juiz do Trabalho - edipro - 1ª edição - 2011.
site: tst.jus.br
CLT - LTr - 2011;
*Mauricio Pereira Simões - Juiz do Trabalho da 2ª Região - Especialista pela PUC/SP em direito e processo do trabalho e pela FDUSP em direito do trabalho e da seguridade social. Professor.

3 comentários:

  1. Grande Maurício, excelente artigo. Parabéns Gostaria de fazer duas observações.

    A primeira deles seria uma eventual renúncia de Jus postulandi com a outorga de procuração, ainda que esta possa ser revogada posteriormente. Talvez esse argumento possa considerar devidos os honorários advocatícios mesmo nos casos de ações celetistas.

    A segunda decorre mais de uma preocupação. A questão da sucumbência poderia, em caso de não concessão do benefício da justiça gratuita, onerar os reclamantes ao pagamento de honorários e sendo assim, na minha opinião, abre-se um perigoso precedente de coibir a garantia constitucional de acesso à justiça naqueles casos em que sabidamente o interesse de agir decorre de pretensão que permeia linha tênue entre a procedência e a improcedência. Daniel Glomb

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  2. Boa noite Maurício, belo artigo!

    Gostaria de aproveitar que o nosso colega Daniel iniciou os comentários e manifestar a respeito dos honorários de sucumbência na Justiça do Trabalho. É um tema muito interessante e tende a ter calorosos debates, que é justificado pelo aumento do poder da Justiça do Trabalho. Entendo que a condenação ao pagamento de honorários não iria inibir o acesso à justiça ao reclamante, pois se o mesmo não é beneficiário da justiça gratuita é porque tem condições de manter o processo sem prejudicar o seu sustento, bem como de seus familiares, devendo, assim, assumir o risco como em qualquer outra pretensão, pagando as custas ao final por ser sucumbente. E querendo ou não, é uma forma de inibir aventuras jurídicas, fortalecendo a seriedade da Justiça do Trabalho. Acho também, que a Justiça do Trabalho deve ter o mesmo peso de importância e seriedade do restante do Poder Judiciário, não deixando jamais de visar a proteção do trabalhador, e é o que está acontecendo, digamos que a Justiça do Trabalho ainda está se profissionalizando.
    Hoje mesmo, uma funcionária pública que advogou na área trabalhista até meados de 2006 perguntou como está a Justiça do Trabalho da nossa região, já que na época que ela advogava mal era possível ver um processo terminar que já tinha acordo, que os advogados usavam poucos dos seus conhecimentos na vida prática, que as instalações, apesar de ser federal, eram péssimas... e respondi que está melhorando, aqui em Americana temos ótimas instalações e os advogados mais bem preparados, sendo comum as partes discutirem a ação até a 2ª Instância....
    Assim, concluo que esse seria um dos motivos que justifica o pagamento dos honorários, a Justiça do Trabalho está “profissionalizando” e precisamos valorizar os profissionais da área.
    Um abraço.

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  3. Daniel e Éder, pela ordem de manifestação:
    Daniel,
    Suas preocupações são mais do que relevantes. Considero que a implementação de honorários, mesmo em ações que envolvam relação de emprego, precisam passar pelo crivo do "jus postulandi", pois esse sempre foi o argumento usado para tolher o direito a referido instituto. O juízes e mais incisivamente os advogados devem lutar pela implementação dessas medidas. Não acho que isso, em algum momento, acabe por restringir amplo acesso, nem cause temor de movimentar demandas. Comecemos pelo fato de que a maioria das demandas são, no mínimo, procedentes em parte, bem como o fato de que pode haver um estudo aprofundado das condições do empregado arcar com os custos do processo, inclusive honorários e então estaria dispensado dessa verba.
    Quanto ao Éder, acho que sua indagação, em parte, passa pela meema preocupação do Daniel, de prestigiar a atuação da advocacia, anseio ao qual me filio irrestritamente.
    O debate, neste ponto, é essencial.
    Lembrem-se, quem comanda os limites da lide são os advogados, por isso, vocês precisam fomentar essas discussões dentro de seus processos.
    Forte abraço aos dois,
    Mauricio.

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